sexta-feira, 25 de julho de 2014

Anões com armas, anões com palavras..

Vamos supor que eu, professor, dissesse em sala de aula que pessoas do Norte do Brasil não são tão competentes quanto as do Sul do país. Obviamente, essa é uma hipótese que por si só é absurda, mas as desdobremos para fins elucidativos. Algum professor de outra área, eventualmente, me corrige, apontando que meu comportamento é inadequado com o que se espera de um professor. Minha reação, dentro de tal hipótese, seria dizer que tal professor perdeu a chance de ficar quieto e que sua opinião demonstra seu "nanismo docente". Foi mais ou menos isso que aconteceu na relação entre Israel e Brasil, mas que falarei depois.
Recentemente, fui provocado a falar sobre um vídeo compartilhado no Facebook pela Federação Israelita de São Paulo. Como faço esta postagem para ser atemporal, espero que não removam o vídeo, que pode ser assistido abaixo no momento em que escrevo.
Analise-se quem postou tal vídeo. Não estamos falando de um vídeo com intenção de analisar geopoliticamente o governo de Israel e suas atitudes, mas de uma federação cuja principal proposta é "fortalecer o judaísmo, preservando a continuidade dos valores e tradições judaicas", conforme pode ser observado aqui


Eis um de nossos problemas, tal federação não busca em nenhum momento dissociar a ideia de que há um conflito territorial em pauta, omitindo o projeto nacional israelense e defendendo a tese de que tais eventos são por inveja, religiões ou por pura violência. Israel quer existir como um estado judaico e viver em paz, diz, mas esse mesmo direito é tolhido aos palestinos, como se eles não habitassem a região previamente. Mais que isso, o discurso mostra o tempo todo o uso do termo judeu e há consequências imediatas disso, pois o leitor mais atento saberá que judeu e muçulmano não são termos sinônimos a israelenses e palestinos, respectivamente - mas nem todos os leitores são atentos a essa nuance, fato que pode fazer com que alguém imagine que os conflitos explicam-se somente por esse viés. As religiões nem são tão diferentes assim, já que o alcorão tem grande influência do Antigo Testamento, não?..
O estadunidense diz ser um conflito simples, mas ele é complexo, sim. Como escreveu um amigo palpiteiro da USP, "pessoas estúpidas apreciam respostas simples para questões complexas". Dizer que o conflito é baseado na intenção de um querer o outro povo morto reduz o outro a agente capaz de oferecer somente violência, excluindo-se os direitos que este poderia eventualmente ter.

Há anos que muitos países árabes reconhecem Israel, embora a situação não tenha melhorado para os palestinos, que vivem ainda refugiados em zonas onde não possuem controle sobre suas terras. A recordar, um Estado só existe quando uma sociedade consegue exercer controle sobre um determinado território. Do contrário, não há Estado - simples assim.
Cita-se que em 1947, as Nações Unidas votaram por "dividir a terra chamada Palestina", e que os israelenses aceitaram,  embora os árabes não tenham aceitado integrar tal discussão porque, segundo a visão distorcida e obviamente inferior deles, um conflito iniciado na Europa não poderia jamais ter sua resolução custando o controle de metade daquele país, ainda mais quando se lembra que a Palestina não é exatamente um vizinho da Alemanha.. Não gosto da ideia de achar que existem coisas óbvias, mas vou me dar o luxo de não abordar os motivos pelos quais os judeus aceitaram e os palestinos, não..
A omissão sobre a resolução 242 da ONU (que é polêmica e alvo de interpretações segundo o interesse diplomático) demonstra a intenção de reduzir os conflitos a nós x elesbem x mal e demais variáveis que traduzam algum tipo de antagonismo. Aliás, entregar o Sinai não foi algo gratuito e altruísta: o país ganhou muito "abrindo mão" da área - no mínimo, o apaziguamento das tensões com o Egito, que deixou de ser o principal articulador do pan-arabismo e passou a fiscalizar a fronteira sul da Faixa de Gaza,
Foi famosa a posição da OLP de não reconhecer Israel como um Estado independente, mas no final dos anos 70 os palestinos tomaram uma posição que pegou muita gente desprevenida: impôs o reconhecimento mútuo ou, em outras palavras, só reconheceria Israel caso este os reconhecessem de acordo com as fronteiras anteriores ao conflito de 1967;
A proposta de 2000 foi recusada por não agradar aos palestinos, simples assim. Lembro-me que, à época, dizia-se que os israelenses teriam autorização para exercerem controle militar de certas áreas, mesmo elas sendo devolvidas aos palestinos. Não há problemas em um país recusar uma proposta, já que não se é obrigado a aceitar algo só por ter sido oferecido;
Sobre a suposta demonização de judeus nas escolas, apenas lembro que há severas contestações às práticas do governo israelense (de novo, o governo é uma coisa, a religião do povo é outra). Além disso, o que é terrorismo? Temos que identificar os agentes de violência que se encontram no local. De um lado, o Estado Israelense age em franco interesse próprio (excluindo-se os de sua população, inclusive os sefarditas, grupo composto por árabes judeus). Sob essa ótica, grupos como Hezbollah e Hamas passam a ter uma imagem de resistência perante a violência imposta. Contudo, não se pode esquecer que, por décadas, o mundo viu Israel como um país cercado de vizinhos belicosos e de baixa flexibilidade perante os interesses da paz. Se isso foi o pensamento dominante por décadas, hoje em dia já não é assim, sendo que tal pensamento é fruto muito mais do pensamento crítico que tem surgido no mundo do que propriamente a uma campanha de propaganda, como alega nosso interlocutor;
Não se deseja demonizar um lado, mas o debate sobre a paz no Oriente Médio passa, essencialmente, pelo debate ao direito pelo território que os palestinos tem e que vem sendo negligenciado pelos israelenses, que vem descumprindo resoluções internacionais (como as da ONU) há décadas. Paralelamente a isso, o país não soube aceitar a movimentação brasileira ao chamar o embaixador de volta para esclarecimentos. Diante de uma postura muito madura, chamou-se o Brasil de "anão diplomático", frase com ampla divulgação no país. Algo que certamente agradou a Denis Prager, personagem que aparece no vídeo citado e que é não somente conservador, mas judeu. Reduzem-se os interesses palestinos à mera intolerância em função de seus próprios interesses.

Simples assim.

Recomendo alguns links para leitura:

E, tirando sarro da resposta do israelense, recomendo: http://portavozisrael.tumblr.com/ 

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